Cinema nacional sofre (mais) ataques
Semana também teve: "Soul" no streaming; Warner esconde bilheteria de “Tenet”; Marvel anuncia várias novidades; Madonna dirige filme sobre a própria vida; e mais.
por Renato Silveira (@silveirarenato)
Linn da Quebrada em cena do premiado documentário “Bixa Travesty”, alvo de ataque gratuito do presidente da Petrobras. Foto: Arteplex/Canal Brasil.
Segue o impasse na Ancine quanto ao andamento de projetos aprovados em editais. A Justiça derrubou decisão que obrigava a Agência Nacional do Cinema a finalizar as análises desses projetos, após uma série de produtoras terem movido ação para acelerar o trâmite. A decisão que negou a urgência argumenta que a Ancine não teria capacidade operacional para a seleção dos projetos e nem disponibilidade financeira para tal. Não é pouca coisa: 4.219 longas-metragens e séries estão com as suas prestações de contas em aberto. O efeito dessa demora certamente será sentido nos próximos anos, podendo até mesmo resultar numa paralisia do setor. É grave. (Folha)
A situação da Cinemateca Brasileira continua sem novidades -- e os profissionais que lá trabalhavam chamam a atenção para o perigo que a instituição ainda corre. Como se não bastasse, uma dentista foi nomeada para assumir a chefia do Centro Técnico Audiovisual (CTAv), órgão indispensável para a preservação do audiovisual brasileiro. Mais: ela é amiga do secretário da Cultura, Mário Frias. A Abraccine e a ABPA (Associação Brasileira de Preservação Audiovisual) repudiaram a decisão. (Correio)
Enquanto isso… O presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse que a estatal não irá mais patrocinar filmes "de qualidade mais que sofrível", usando o documentário “Bixa Travesty” como exemplo. No entanto, o filme escolhido como alvo não recebeu verbas da empresa para sua produção. Pior: depois de pronto, o filme deveria ter recebido um prêmio por ter participado do Festival de Brasília, realizado com patrocínio da Petrobras, mas acabou recebendo apenas metade do valor. Calote! A atriz e cantora Linn da Quebrada, protagonista do documentário dirigido por Claudia Priscilla e Kiko Goifman, disse que a fala de Castello Branco é um ataque à cultura. “Uma fala como essa não só reflete, mas também constrói os nossos tempos. Além de desrespeitosa, ela se coloca como uma barreira à possibilidade de afirmar e deslocar nossos corpos para outros lugares”, disse a artista. (O Globo)
Por falar em gente que critica sem saber do que está falando... A ministra Damares Alves abriu campanha nas redes sociais contra o filme francês “Lindinhas” (Cuties), lançado pela Netflix. Premiado no Festival de Sundance e sem provocar polêmicas quando exibido na França, o documentário é acusado de sexualizar jovens garotas. A divulgação equivocada feita pela própria Netflix reforçou a controvérsia -- que vários críticos afirmam não existir no filme em si, cujo objetivo é justamente o oposto: denunciar a pedofilia e a erotização infantil. Damares chamou a produção de “abominável” e sugeriu que pode intervir para proibir a exibição do longa no Brasil. A Netflix disse em um comunicado que o filme trata de um “comentário social contra a sexualização de crianças pequenas”. (Estadão)
A Warner não está compartilhando os números exatos da bilheteria de “Tenet”. Tradicionalmente, o mercado nos EUA recebe relatórios diários de venda de ingressos. Mas com “Tenet” houve demora na divulgação do primeiro fim de semana e há suspeita de que o estúdio esteja segurando dados para não dar a impressão de que o filme “flopou”. Analistas e concorrentes estão insatisfeitos com essa falta de transparência, já que ela atrapalha uma visão mais precisa do momento da reabertura dos cinemas para favorecer uma campanha de marketing. Nos primeiros dias da estreia nos EUA, o longa arrecadou 20 milhões de dólares. Na segunda semana, apenas 10 milhões. Mundialmente, o faturamento já passa dos 200 milhões, mas, para não “flopar” oficialmente, a bilheteria final de “Tenet” precisa passar dos 400 milhões de dólares pelo menos. (Variety)
Conforme antecipei na edição passada da newsletter, “Soul”, mais nova animação da Pixar, pode ter como destino o serviço de streaming Disney+. Por enquanto, o filme continua agendado para 20 de novembro nos cinemas dos EUA, mas os rumores sobre o cancelamento ganharam força nos últimos dias. Não só isso: a Universal Pictures, possivelmente já em posse de alguma informação mais precisa, antecipou a estreia de “Os Croods 2” do Natal para 25 de novembro. Raramente estúdios colocam filmes com o mesmo público-alvo perto um do outro. Se a Disney confirmar, a exibição de “Soul” nos cinemas não deverá ocorrer nos países onde a plataforma já funciona, porém, ainda não se sabe o longa será vendido por um valor extra, como “Mulan”, ou se será adicionado diretamente ao catálogo. Vale lembrar que a Disney+ já estará em atividade no Brasil em novembro, portanto, este pode ser o primeiro filme da Pixar sem lançamento nos cinemas do país. A Disney também estuda adiar “Viúva Negra”, da Marvel, que está previsto para 6 de novembro, nos EUA. Neste caso, o estúdio ainda não estaria cogitando um lançamento direto no streaming. (Variety)
A questão toda é: os cinemas correram para reabrir com "Tenet", mas o público não compareceu como as redes e os estúdios esperavam. Agora, as salas deverão ficar meses sem grandes lançamentos, já que outubro foi esvaziado e novembro corre o mesmo risco. Vale lembrar que, nos primeiros meses da pandemia, os donos dos cinemas nos EUA contestavam a pressa em reabrir as salas, argumentando justamente que a falta de grandes lançamentos geraria ainda mais despesas e poderia quebrar seus negócios. E agora? (Variety)
Por falar em Marvel e Disney+, a série da “Mulher-Hulk” terá direção de Kat Coiro. Ela trabalhou antes nos seriados "I'ts Always Sunny in Philadelphia", "Brooklyn 99" e "Shameless". O roteiro também está sendo escrito por uma mulher: Jessica Gao, de “Rick and Morty”. A atriz principal será Tatiana Maslany, da série “Orphan Black”. Ela fica com o papel de Jennifer Walters, advogada que é prima de Bruce Banner (Mark Ruffalo) e herda seus poderes após uma transfusão de sangue. A data de lançamento de “Mulher-Hulk” não foi confirmada até o momento. (Deadline, Variety)
Outra novidade é que a Disney contratou diretores para a série da Ms. Marvel, a primeira super-heroína muçulmana do estúdio. A equipe tem quatro cineastas: Adil El Arbi, Bilall Fallah (ambos de “Bad Boys para Sempre”), Sharmeen Obaid-Chinoy (duas vezes vencedora do Oscar de Melhor Documentário em Curta-Metragem) e Meera Menon (que já trabalhou em séries como “The Walking Dead” e “O Justiceiro”). O chefe da Marvel Studios, Kevin Feige, já afirmou anteriormente que a protagonista Kamala Khan será inserida em futuros filmes da franquia. Em breve, portanto, teremos o anúncio da atriz que viverá a personagem. (Heat Vision)
Não para aí, marvetes: protagonista da série “Lovecraft Country”, Jonathan Majors foi escalado para um dos papéis principais de “Homem-Formiga 3”. O ator, que também foi elogiado por seu trabalho em “Destacamento Blood” e “O Último Homem Negro em San Francisco”, deve interpretar o supervilão Kang, o Conquistador. Nos quadrinhos, ele é um déspota viajante do tempo que vem de um futuro distante, tendo enfrentado vários dos Vingadores. Será ele o próximo Thanos? Diretor dos dois primeiros filmes do Homem-Formiga, Peyton Reed está confirmado na direção do terceiro, com Paul Rudd vivendo novamente o super-herói. Ainda não há data de estreia. (Heat Vision)
E as filmagens do novo “Batman” foram retomadas no Reino Unido, após o ator Robert Pattinson ter testado positivo para Covid-19. De acordo com a Warner, a produção ficou interrompida por 14 dias para seguir o protocolo de quarentena. O estúdio, no entanto, continua sem comentar oficialmente que Pattinson pegou o vírus, embora veículos de imprensa de Hollywood tenham confirmado a informação nos bastidores. (The Hollywood Reporter)
A “Rainha do Pop” Madonna irá dirigir um filme autobiográfico com roteiro assinado por ela e Diablo Cody, roteirista de filmes como “Juno” e “Garota Infernal”. O projeto é desenvolvido na Universal Pictures e, segundo a própria Madonna, o foco do longa “sempre será a música”. “Existem tantas histórias inspiradoras e não contadas, e quem melhor para contá-las do que eu? É essencial compartilhar a montanha-russa da minha vida com minha voz e visão”, declarou a estrela. Madonna é a artista musical feminina mais bem-sucedida da história do mercado fonográfico, tendo vendido 335 milhões de discos em todo o mundo. Ela também continua sendo a artista solo de turnê de maior bilheteria de todos os tempos. No cinema, já dirigiu os filmes “Sujos e Sábios” (2008) e “W.E.: O Romance do Século” (2011). (The Hollywood Reporter)
Naomi Watts e o diretor Phillip Noyce trabalham juntos no thriller “Lakewood”. O filme, escrito por Chris Sparling (“Enterrado Vivo”), acompanha uma mãe (Watts) que corre desesperadamente contra o tempo para salvar seu filho enquanto as autoridades impõem um lockdown na pequena cidade onde ela vive. O veterano Noyce, de 70 anos, diretor de filmes como “Jogos Patrióticos”, “Invasão de Privacidade” e “O Colecionador de Ossos”, deu início às filmagens nesta semana, em Ontário, no Canadá, seguindo protocolos de segurança contra a Covid-19. De acordo com os realizadores, a maior parte das cenas tem apenas a personagem de Watts, fator que facilita a realização do filme neste momento. (Variety)
John Boyega será dirigido por Gavin Hood na adaptação do romance “The Test”. O livro de Silvain Neuvel se passa em um futuro próximo e autoritário (sempre pode piorar...), quando um imigrante (Payman Maadi) se une a um jovem psicólogo (Boyega) para confrontar um grupo terrorista liderado por um fanático de extrema-direita. O sul-africano Hood chamou a atenção de Hollywood com “Infância Roubada” (2015), mas até hoje não conseguiu emplacar um novo sucesso. Seu mais recente trabalho foi o thriller político “Segredos Oficiais” (2019), protagonizado por Keira Knightley. Já Boyega trilha sua carreira pós-“Star Wars”. Ele será visto este ano no drama racial “Small Axe”, dirigido por Steve McQueen, e no policial “Naked Singularity”, estreia na direção de Chase Palmer, roteirista de “It: A Coisa”. (Deadline)
O ator alemão Daniel Brühl faz sua estreia na direção com “Next Door”. O ator de “Edukators” e “Rush - No Limite da Emoção” também é o protagonista da comédia sarcástica que gira em torno de um astro do cinema que vê sua vida privada e sua carreira em risco quando um vizinho o confronta com revelações perturbadoras. O antagonista é vivido por Peter Kurth (“Adeus, Lenin!”). As filmagens foram retomadas após a interrupção provocada pela pandemia e já estão perto de serem finalizadas. (Cineuropa)
A Netflix comprou os direitos de distribuição do drama “Pieces of a Woman”, que deu a Vanessa Kirby o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Veneza, sábado passado. O longa é dirigido pelo húngaro Kornél Mundruczó (“White God”) e também está sendo elogiado pela performance de Shia LaBeouf. A trama é sobre um casal que entra em crise após perder o primeiro filho em um parto feito em casa. Ainda não há data de lançamento, mas a Netflix certamente quer ver o filme concorrendo no Oscar 2021. (Variety)
A Netflix também comprou “Malcolm & Marie”, drama com Zendaya e John David Washington que foi filmado secretamente durante a pandemia. A direção é de Sam Levinson, filho do cineasta Barry Levinson (“Bugsy”, “Rain Man”) e criador da série “Euphoria”, protagonizada pela atriz e cantora. O filme é sobre um diretor e uma atriz que namoram e têm uma noite difícil para a relação quando retornam para casa após a noite de lançamento do último trabalho que fizeram juntos. O longa foi rodado em 35mm e em preto-e-branco. Ainda não há data para o lançamento. (The Hollywood Reporter)
Na guerra do streaming, mais uma plataforma entra na disputa: a CBS All Access está sendo reformulada e passará a se chamar Paramount+. E o carro-chefe da nova fase do serviço do grupo ViacomCBS será a série “The Offer”, sobre os bastidores da realização de “O Poderoso Chefão”. Outra atração é um spin-off de “Bob Esponja” chamado “Kamp Koral”. As novidades irão começar a ser lançadas nos primeiros meses de 2021. (The Live Feed)
Muitas novidades nos streamings, mas e os clássicos, onde estão? De acordo com levantamento feito pelo DeltaFolha entre julho e agosto, Netflix, Amazon Prime Video, Telecine Play, Globoplay e HBO Go tinham, todas, mais de 50% de seu acervo cinematográfico ocupado por produções lançadas nos últimos dez anos. A pesquisa concluiu o que todo cinéfilo já havia notado: é raro encontrar longas lançados no século passado. Como se já não bastasse a escassez, esses títulos costumam ficar escondidos, longe das categorias principais e das páginas iniciais das plataformas. As opções no Brasil para quem procura filmes anteriores aos anos 50 ou produções mais experimentais têm sido apenas plataformas de menor alcance, como MUBI e Belas Artes À La Carte. (Folha)
É isso. Até a próxima edição!
Forte abraço e cuide-se,
Renato Silveira
Editor-chefe do Cinematório