Coronavírus: estreias adiadas, eventos cancelados e cinemas fechados se espalham pelo mundo
Também nesta edição: Harvey Weinstein condenado, Pixar censurada, novos "Drácula" e "Pânico", o documentário inédito dos Beatles, o adeus a Max von Sydow
Cena do filme “Contágio” (2011), de Steven Soderberg - Distribuição: Warner Bros.
A semana começou com a notícia de que o novo coronavírus atingiu um dos mais famosos astros de Hollywood: Tom Hanks e sua esposa, Rita Wilson, anunciaram que testaram positivo para COVID-19. Eles estão na Austrália, onde Hanks participa das filmagens da cinebiografia de Elvis Presley dirigida por Baz Luhrmann (“Moulin Rouge”). Na verdade, ele participava: a produção foi suspensa por causa da agora pandemia da doença. A internet não resistiu e surgiu um meme de Hanks com a bola Wilson, de “Náufrago”, supostamente registrada no local de sua quarentena. É uma imagem engraçada, mas também é falsa: a foto é de 2015. (IndieWire; Agência Lupa)
Se antes apenas produções na China estavam sendo suspensas, agora o efeito é global e atinge em cheio Hollywood. O novo filme de Guillermo del Toro, “Nightmare Alley”, interrompeu as filmagens, assim como a versão live-action de “A Pequena Sereia”, o novo filme de Ridley Scott, “The Last Duel”, e a produção da Marvel “Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis”, entre outras. Além da ameaça do coronavírus, todas essas produções têm em comum o fato de terem a Disney por trás. Já a Sony suspendeu as filmagens de “The Nightingale”, drama estrelado pelas irmãs Dakota e Elle Fanning. (Deadline; Variety)
E depois de “007 - Sem Tempo Para Morrer”, adiado de abril para novembro, vários outros filmes que estavam para estrear nos cinemas nos próximos dois meses tiveram seus lançamentos adiados ou até mesmo suspensos, sem novas datas previstas. “Um Lugar Silencioso - Parte 2”, que estrearia no próximo dia 19 e já tinha inclusive cabines de imprensa e pré-estreias anunciadas, foi cancelado e ainda não tem nova previsão para chegar aos cinemas. O diretor e ator John Krasinski escreveu uma tocante mensagem para dar a notícia aos fãs no Twitter.
Já “Velozes e Furiosos 9” foi adiado do próximo 21 de maio para abril do ano que vem. Na véspera do anúncio pela Universal Pictures, Vin Diesel chegou a dizer que a estreia não precisaria ser cancelada e que ele iria pessoalmente à China no lançamento abraçar os fãs da franquia. A Universal também suspendeu “Trolls 2”, que seria lançado em 9 de abril. (The Playlist)
A Disney cancelou o lançamento de “Mulan”, previsto para 26 de março. O estúdio também cancelou "Espíritos Obscuros" (Antlers), previsto para 16 de abril, e "Os Novos Mutantes", que após vários adiamentos finalmente estrearia em 2 de abril. Nenhum desses tem previsão de estreia agora e os estúdios vão aguardar os desdobramentos da pandemia para anunciar novas datas. Logisticamente, será uma tarefa difícil, já que o calendário de lançamentos é definido com muita antecedência e depende de vários acordos com as redes de cinemas e entre os estúdios. Conforme for o avanço da doença, que já transferiu seu epicentro para a Europa e tem crescido muito nos EUA, é bem possível que filmes previstos para maio e até mesmo junho também suspendam suas estreias. Saberemos nos próximos dias.
O cinema brasileiro também já teve cancelamentos de estreias: o lançamento duplo de "A Menina que Matou os Pais" e "O Menino que Matou Meus Pais" não acontecerá mais no próximo dia 2 de abril. Uma nova data ainda não foi definida. A comédia nacional “No Gogó do Paulinho” também teve sua estreia adiada. Estava marcada para 16 de abril e não tem nova data confirmada, mas o distribuidor mantém previsão para 2020. Por fim, "Três Verões", de Sandra Kogut, com Regina Casé no papel principal, seria lançado na semana que vem, em 19 de março, e também ainda não tem nova data. (Cinematório)
Com tantas estreias sendo canceladas, os serviços de streaming e VoD estão bombando. Mas não pense que não serão afetados também. Ainda que as produções originais já prontas ou em finalização estejam com seus lançamentos mantidos, todas as outras que ainda seriam ou estão sendo filmadas já foram afetadas. Na Netflix, o maior impacto é na quarta temporada de “Stranger Things”, mas “Boneca Russa” e “Grace e Frankie” também tiveram que suspender as gravações por pelo menos duas semanas. Na HBO, a segunda temporada de “Euphoria” teve o início da produção adiado. Na Apple TV+, a realização de todas as séries foi suspensa, incluindo “Servant” e “The Morning Show”. E na FX, a suspensão afeta “Fargo”, “Atlanta”, a inédia “Y” (baseada na famosa HQ), entre outras. (IndieWire)
Os cancelamentos de festivais e eventos da indústria audiovisual também continuam. Um dos mais recentes é o da CinemaCon, convenção que acontece anualmente em Las Vegas e reúne os principais estúdios para anúncios dos próximos lançamentos para os donos das redes de cinema. Aconteceria de 30 de março a 2 de abril e agora só deve voltar a ser realizado em 2021. A WonderCon, marcada para 10 a 12 de abril, foi adiada para a frustração dos fãs de quadrinhos. A Comic-Con de San Diego continua agendada para julho, mas já há temores de que seja afetada também. Vários festivais e mostras nos EUA, no Canadá e na Europa também foram cancelados, incluindo o prestigiado Festival de Tribeca, em Nova York. A Disney fechou seus parques temáticos. Em vários países, museus e salas de cinema estão fechando as portas ou reduzindo a carga de ingressos para as sessões. Nunca vimos algo dessa proporção na história recente. (IndieWire; Deadline; The Wrap; Variety)
Por enquanto, Cannes está mantido para maio, mas o presidente do festival já admite a possibilidade do cancelamento. Um dos maiores problemas que festivais desse porte enfrentam é o seguro para casos de epidemias ou pandemias como a do coronavírus: não há cobertura. No caso do SXSW, por exemplo, os custos do cancelamento podem inclusive inviabilizar a realização do festival em 2021. Mas em um esforço para não prejudicar os realizadores dos filmes inscritos na edição 2020, o SXSW decidiu manter pelo menos a entrega dos prêmios, viabilizando a exibição das produções via link para os jurados. Cada diretor deverá manifestar interesse ou não em proceder dessa forma. (Le Figaro; The Wall Street Journal; IndieWire)
No Brasil, embora já se tenha notícias de algumas mostras locais suspensas, por enquanto nenhum festival de cinema foi cancelado. Pelo contrário: o É Tudo Verdade anunciou a seleção de documentários da sua edição comemorativa de 25 anos. Haverá homenagem a Santiago Álvarez e ao cinema feminino, mostra inédita de série de Chris Marker e 10 filmes na competição brasileira, além de 12 na internacional. Títulos que marcaram as 24 edições anteriores do festival também serão exibidos em mostra especial, incluindo “O Prisioneiro da Grade de Ferro”, de Paulo Sacramento, única produção brasileira premiada como melhor documentário nacional e internacional. A abertura do É Tudo Verdade está marcada para 25 de março, em São Paulo. Um dia depois, começa a edição paulista da Mostra de Tiradentes. É aguardar para ver se haverá mudanças nas datas em função do coronavírus. (Revista de Cinema)
Agora, para notícias não relacionadas ao coronavírus. Harvey Weinstein foi enfim condenado. Pegou 23 anos de prisão, conforme a sentença pronunciada pelo tribunal penal do Estado de Nova York. A pena vale pelas duas acusações em que o ex-produtor foi considerado culpado no final de fevereiro: um crime de primeiro grau (sexo oral forçado) e violação em terceiro grau (sexo sem consentimento expresso). As vítimas, nesses casos, foram a produtora Miriam Haley e as atrizes Annabella Sciorra e Jessica Mann. Weinstein ainda será julgado, e provavelmente condenado, por inúmeros outros casos de estupro e assédio sexual. Este é só o começo. (IndieWire)
Várias entidades da indústria cinematográfica na Europa assinaram um manifesto em que expressam profunda preocupação com a iminente prisão do cineasta iraniano Mohammad Rasoulof. Ele venceu o Urso de Ouro em Berlim este ano com o filme “There Is No Evil”, em que contesta a pena de morte em seu país. Seus trabalhos anteriores já eram muito críticos ao governo iraniano e, como resultado, ele foi acusado de fazer propaganda contra o Estado. Foi sentenciado a um ano de prisão e dois anos de proibição para filmar, além de não poder sair do país (ele não foi a Berlim receber o prêmio devido a essa restrição). O Irã é um dos países com grande número de casos de coronavírus, e nas prisões do país a situação é ainda pior. O manifesto pede que as autoridades iranianas garantam condições de saúde e segurança para Rasoulof, mas que, principalmente, as acusações contra ele sejam retiradas. (Cineuropa)
A intolerância também atinge a mais nova produção da Pixar, “Dois Irmãos”. O filme foi banido em países como Kuwait, Catar, Arábia Saudita e Omã. Já na Rússia, foi censurado. O motivo: a animação tem uma personagem abertamente gay, a policial lésbica Specter (dublada pela atriz Lena Waithe). Ela tem apenas uma cena e uma fala que revelam sua sexualidade, mas foram suficientes para os autoritários arrancarem os cabelos e determinarem a censura em nome da proteção das criancinhas. Vale lembrar que “Vingadores: Ultimato” e “Star Wars: A Ascensão Skywalker” também sofreram cortes em países conservadores por trazerem breves cenas com personagens homossexuais. (Deadline)
O sucesso de “O Homem Invisível” levou a Blumhouse Productions a considerar seriamente fazer novas releituras de clássicos do cinema e da literatura de horror. O próximo filme do estúdio será “Drácula” e já tem diretora: Karyn Kusama, de “O Convite” e “O Peso do Passado”. O roteiro está sendo escrito por Matt Manfredi e Phil Hay, que já trabalharam com Kusama. A Blumhouse também planeja produzir uma nova versão de “Frankenstein” e pode ser que James Wan (“Invocação do Mal”) seja o produtor. No entanto, cada um desses filmes será independente, sem aquela história já fracassada de “Monstroverso” que a Universal começou a elaborar com “A Múmia”, estrelado por Tom Cruise. (Heat Vision)
E tem mais clássico do terror voltando: “Pânico” ganhará mesmo um reboot. O duo Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett (de “Casamento Sangrento”) foi contratado para escrever e dirigir o longa, que terá outros personagens, mas a mesma premissa: uma mulher volta para sua cidade natal para tentar descobrir quem está cometendo uma série de assassinatos. Kevin Williamson, criador da franquia junto com Wes Craven, será produtor executivo. A Spyglass é o estúdio que adquiriu os direitos que pertenciam a Miramax/Weinstein Company. (Bloody Disgusting)
“Os Novos Mutantes”, como já dissemos, não será mais lançado em abril em razão da pandemia de coronavírus. O filme, que é ligado à franquia “X-Men”, está há quase três anos na geladeira, e muito se especulou que ele estava sendo adiado porque o estúdio não estava satisfeito com o resultado. Mas em uma entrevista para a Entertainment Weekly, já como parte da campanha de divulgação para a estreia agora cancelada, o diretor Josh Boone desbancou os boatos e revelou que não refilmou uma cena sequer de “Os Novos Mutantes”. Segundo ele, o problema todo foi a compra da Fox pela Disney. Boone conta que estava na pós-produção quando a fusão começou e mandaram ele paralisar o projeto quando estava com 75% do filme pronto. O projeto ficou parado por um ano exatamente desse jeito, até que a Disney chamou Boone de volta para finalizar o longa. Ele conta, que mesmo que o estúdio quisesse refilmar alguma coisa, não seria possível, porque os atores, a maioria adolescente na época das filmagens originais, já havia crescido. Ainda não se sabe quando e como “Os Novos Mutantes” será lançado diante do novo adiamento. Um lançamento apenas no Disney+ não está descartado. (EW)
A Netflix assinou contrato com o ator John Boyega e sua produtora UpperRoom para realizar pelo meno três filmes na África, usando idiomas locais. Um dos longas será filmado no Egito e outros dois serão feitos na Nigéria. O anúncio vem uma semana depois de a Netflix lançar sua primeira série original africana, a ótima “Queen Sono”, que traz uma trama de espionagem e política em meio a boas cenas de ação. Vale a pena conferir. (The Hollywood Reporter)
Peter Jackson se afastou dos filmes de ficção e está investindo em documentários. Depois de “They Shall Not Grow Old”, sobre a Primeira Guerra Mundial, ele está finalizando “The Beatles: Get Back”, que será um presentão para os beatlemaníacos. O filme promete resgatar todo o complicado processo de gravação do último álbum do grupo, “Let It Be”, bem como a última e histórica apresentação ao vivo deles, no terraço da Apple Corps, em Londres. Jackson pôs as mãos em mais de 55 horas de imagens inéditas filmadas em 1969, além de 140 horas de áudio gravado nas sessões de “Let It Be”. Todo esse material ganhará o mesmo impressionante tratamento de “They Shall Not Grow Old”, que restaurou as imagens ao ponto de elas parecerem ter sido filmadas ontem. Portanto, os fãs verão os Beatles como nunca viram antes. Com apoio de Paul McCartney, Ringo Starr e Yoko Ono, o filme será lançado nos cinemas pela Disney (o que não é da Disney hoje em dia...) em 4 de setembro, nos EUA, rodando o mundo em seguida. Mais um motivo para torcermos para a crise do coronavírus passar logo. (Reverb)
In Memoriam: Morreu Max von Sydow, aos 90 anos. O ator franco-sueco jogou xadrez com a Morte em “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman, e foi o padre Merrin, em “O Exorcista”, de William Friedkin. Ao longo de 65 anos de carreira, Sydow colecionou personagens e filmes memoráveis. Só com Bergman, trabalhou ainda em “Morangos Silvestres”, “A Hora do Lobo”, “Luz de Inverno”, “Através de um Espelho”, “A Fonte da Donzela”, “Vergonha”, “A Paixão de Ana”, “A Hora do Amor” e “No Limiar da Vida”. Em sua extensa e versátil filmografia também se destacam: “A Maior História de Todos os Tempos”, “Flash Gordon”, “007 – Nunca Mais Outra Vez”, “Hannah e Suas Irmãs”, “Minority Report”, “Ilha do Medo” e “Star Wars: O Despertar da Força”. Sydow foi ainda indicado duas vezes ao Oscar: como Melhor Ator, por "Pelle, o Conquistador", e Melhor Ator Coadjuvante, por "Tão Longe, Tão Perto". Ele ganhou o prêmio de Melhor Ator no Festival de Veneza por "O Voo da Águia". Um dos seus últimos trabalhos foi na série "Game of Thrones", na qual interpretou o Corvo de Três Olhos. Mais um gigante que se vai.
É isso. Até a próxima edição!
Forte abraço,
Renato Silveira
Editor-chefe do Cinematório