Janela estilhaçada
Em acordo que pode mudar o modo como os filmes são distribuídos, Universal diminui período de exibição de suas produções nos cinemas em favor do VOD.
por Renato Silveira (@silveirarenato)
Foto: Shutterstock
A Universal Pictures e a AMC Theatres firmaram um acordo histórico para que os filmes do estúdio (incluindo os indies da Focus Features) sejam exibidos nas salas da maior rede de cinemas dos Estados Unidos com uma janela de apenas 17 dias. Janela é o intervalo entre o lançamento do filme nos cinemas e em home video, ou seja, plataformas de streaming, DVD e Blu-ray. Desde o início dos anos 2000 até agora, a janela respeitada era de 90 dias. Com o novo acordo, os filmes da Universal poderão ser exibidos pela AMC por apenas três fins de semana antes de chegarem a plataformas premium de VOD, incluindo a recém-lançada AMC On Demand. Nessas plataformas premium, vale notar, o custo do acesso ao filme é semelhante ou até mais caro que um ingresso de cinema. As discussões entre as duas partes sobre acordos de distribuição internacional ainda estão por vir. (IndieWire)
Quem acompanha nossa newsletter sabe que o acordo encerra uma briga que começou lá em abril, quando a Universal, por conta própria, decidiu lançar a animação “Trolls 2” direto em VOD e cancelar sua estreia nos cinemas. O retorno das vendas online foi tão bom que o presidente da Universal afirmou que passaria a fazer a mesma coisa com os próximos filmes do estúdio. A AMC não gostou nada da ideia e anunciou que iria parar de exibir filmes da Universal. Desde então, as duas companhias negociavam a trégua, que veio com a AMC aceitando receber uma parte do lucro da “bilheteria virtual”.
Por enquanto, o acordo se restringe a Universal e AMC, mas o precedente está aberto para que outras redes de cinema e estúdios celebrem acordos que podem impactar definitivamente o modo como filmes são distribuídos no mundo todo. A pressão para a redução da janela já era grande antes do coronavírus e a atual crise acelerou um processo que era inevitável. Afinal, o prazo entre um filme sair do cinema e ir para a casa do público já chegou a ser de um ano antes do surgimento do VHS e vem sendo reduzido a cada nova tecnologia que surge. Porém, vale considerar que a mudança de agora é mais grave. Não só por acontecer em meio à pandemia, mas porque tem como objetivo privilegiar blockbusters. Estes, enquanto estiverem faturando bilhões de dólares, serão mantidos por meses nos cinemas. Já os filmes independentes que são bancados por estúdios (caso da Focus Features), e até mesmo aquelas produções modestas e despretensiosas, ficarão quase nada em cartaz.
É ilusão achar que “salas de arte” darão conta da demanda, pois muitas delas correm risco de nem mesmo voltarem a funcionar. Portanto, não é difícil vislumbrar um futuro não muito distante em que será cada vez mais difícil sair de casa para ver algo que não seja Marvel, Star Wars, Velozes e Furiosos, Transformers etc. Com sorte poderemos ver os filmes do Oscar. E não só porque não haverá telas para os demais, mas porque simplesmente pode não haver outros tipos de filmes. Se a janela for quebrada de vez nos próximos meses, os estúdios só irão encorajar a realização de produções que vendam pipoca, radicalizando um processo que teve início com os filmes de super-heróis no início dos anos 2000. Para o resto, será o streaming ou nada. (Variety)
Por sua vez, a Warner Bros. anunciou sua nova estratégia de lançamento de "Tenet", de Christopher Nolan. De acordo com uma declaração oficial do estúdio, o filme será lançado em mais de 70 países em todo o mundo a partir de 26 de agosto. Entre os principais estão Austrália, Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Coreia do Sul, Rússia, Espanha e Reino Unido. O filme será lançado nos Estados Unidos em 3 de setembro, mas apenas em cidades onde os cinemas já estejam funcionando. Não serão poucas: a estimativa é de que, até a data pretendida, 80% das salas estadunidenses já estejam operando. No Brasil, a Warner está otimista e marcou a estreia para 10 de setembro, sendo que uma semana antes fará o relançamento de “A Origem” para marcar o aniversário de 10 anos do filme. Aliás, caiu a regra chinesa para exibir apenas filmes com até 120 minutos nos cinemas do país durante a pandemia. Sendo assim, “Tenet” está liberado para passar lá. (IndieWire, Variety)
O Festival de Veneza anunciou a seleção oficial de sua 77ª edição. É o primeiro grande festival que acontecerá desde o início da pandemia. Entre os filmes em competição pelo Leão de Ouro, novos trabalhos de Gia Coppola, Lav Diaz, Kiyoshi Kurosawa e Chloé Zhao. Há um filme brasileiro na seleção, mas fora de competição: o documentário "Narciso em Férias", de Renato Terra e Ricardo Calil ("Uma Noite em 67"), sobre o músico Caetano Veloso, com recorte no período em que ele ficou preso, no fim dos anos 60. (IndieWire, Correio Braziliense)
O Festival de Toronto também anunciou seus filmes, tendo como destaques o thriller “I Care a Lot”, estrelado por Rosamund Pike, o horror “Shadow in the Cloud”, com Chloë Grace Moretz, “Penguin Bloom”, com Jacki Weaver e Naomi Watts, “One Night in Miami”, estreia da atriz Regina King na direção. Do Brasil, está na programação o nosso filme de Cannes, “Casa de Antiguidades”, estrelado por Antônio Pitanga e dirigido por João Paulo Miranda Maria. (The Hollywood Reporter, Cineweb)
Por falar em festival, o tradicional Curta Kinoforum, Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo, será totalmente online este ano. A 31ª edição vai de 20 a 30 de agosto, mas antes terá um “esquenta” com exibição de curtas brasileiros históricos, entre eles "Cartão Vermelho", de Laís Bodanzky, "Viver a Vida", de Tata Amaral, e "Ilha das Flores", de Jorge Furtado. Os diretores irão participar de lives dentro da programação especial que começa no próximo dia 6, no site do festival. (Cineweb)
O imbróglio envolvendo a Cinemateca Brasileira continua. O governo federal havia anunciado a intenção de transferir a instituição e seu acervo de São Paulo para Brasília, mas a mudança não é permitida por lei. Está na escritura do imóvel, justamente para evitar que a Cinemateca seja aparelhada por qualquer governo. A situação dos funcionários sem salário continua drástica, bem como a dos rolos de filmes que precisam de manutenção constante e permanente. (Papo de Cinema)
A TV Cultura estreia na segunda-feira, 3 de agosto, a série documental “Elas”, que retrata mulheres do cinema brasileiro. Apresentada pela atriz Luciana Vendramini, a produção traz perfis de Ruth de Souza, Tônia Carrero, Odete Lara, Elke Maravilha, Beth Goulart, Carla Camurati, Anna Muylaert e muitas outras. São ao todo 25 episódios, que serão exibidos um por semana, sempre às 19h45. (Revista de Cinema)
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A Pixar anunciou que seu próximo filme original será chamado "Luca". Trata-se de uma aventura ambientada na costa da Itália, onde o garoto do título passa um verão inesquecível. Seria o “Meu Chame Pelo Seu Nome” do estúdio? Tomara que sim. A animação será lançada em junho de 2021 e tem direção de Enrico Casarosa (do curta “La Luna”). Confira abaixo a primeira arte conceitual. (Variety)
Mencionei acima o primeiro filme dirigido pela atriz Regina King, selecionado para o Festival de Toronto, e a Amazon já garantiu a compra dele para lançar em sua plataforma Prime Video, bem como em salas de cinema. “One Night in Miami” se passa em 1964 e acompanha um jovem Cassius Clay (que mais tarde se torna conhecido como Muhammad Ali) depois que ele conquista o título de campeão mundial de boxe dos pesos pesados. O filme começa na manhã seguinte à grande luta, quando Clay se reúne com o ativista Malcolm X, o cantor Sam Cooke e o astro do futebol Jim Brown para ajudar o movimento de luta pelos direitos civis nos EUA. (Variety)
Na HBO, o próximo projeto de Adam McKay (“Vice”) tem como tema a corrida para desenvolver uma vacina para a Covid-19. Ele trabalha em uma série baseada no livro ainda inédito do jornalista Brendan Borrell, “The First Shot”, sobre as empresas envolvidas na pesquisa, a ciência das vacinas e os desafios em relação ao acesso e à segurança da imunização. Borrell é especialista na editoria de Ciência e Saúde e já escreveu sobre a pandemia para a National Geographic, Wired e Science. (The Hollywood Reporter)
David Lynch parece estar prestes a iniciar um novo filme ou série. Conversando com o site The Daily Beast sobre seu canal no YouTube, o cineasta foi perguntado sobre seu próximo projeto cinematográfico e admitiu que “pode acontecer algo que signifique menos tempo para ser gasto no canal". Lynch não disse mais nada além disso, mas é sabido que ele tem negociado ativamente com a Netflix desde o acordo para a distribuição de “Twin Peaks - O Retorno”. Aguardamos ansiosamente! (The Playlist)
Os atores Lázaro Ramos e Otávio Müller estão filmando um drama sobre o isolamento social provocado pela pandemia. Baseado na obra de Nelson Rodrigues, “Álbum de Família” é metalinguístico e fala sobre um grupo de atores que se encontra remotamente para ensaiar o texto do dramaturgo, quando começam a questionar regras sociais e acabam envolvendo suas próprias famílias na história. A direção do longa é de Daniel Belmonte e as filmagens estão sendo realizadas com a ajuda de plataformas como Zoom e Skype. (Papo de Cinema)
Courteney Cox irá reprisar seu papel como a repórter Gale Weathers no quinto filme da franquia “Pânico”. Ela se junta a David Arquette, que também retorna como o ex-policial Dewey Riley. A dupla Radio Silence (Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett), de “Casamento Sangrento”, dirige o filme a partir de um roteiro de James Vanderbilt e Guy Busick. Kevin Williamson, roteirista dos longas originais, é um dos produtores executivos. (The Hollywood Reporter)
Jean-Claude Van Damme será o protagonista da comédia de ação "O Último Mercenário", produzida pela Netflix. O astro dos filmes de artes marciais fará o papel de um misterioso ex-agente do serviço secreto que deve retornar urgentemente à França quando seu filho afastado é falsamente acusado de tráfico de armas e drogas pelo governo. As filmagens já começaram. A direção é do estreante David Charnon. (Variety)
Por falar em Netflix, um dos lançamentos da plataforma em setembro será “Ratched”, série sobre a enfermeira Mildred Ratched, de “Um Estranho no Ninho”. Sarah Paulson interpreta a personagem vivida originalmente por Louise Fletcher e que infernizou a vida de Jack Nicholson no filme de Milos Forman. O elenco também conta com Sharon Stone, Cynthia Nixon, Judy Davis, Corey Stoll, Sophie Okonedo e Vincent D’Onofrio. Os produtores são Ryan Murphy e Michael Douglas. Veja as primeiras fotos.
A Netflix também divulgou fotos de sua refilmagem (ou nova adaptação) de “Rebecca”, clássico de Alfred Hitchcock baseado no livro de Daphne du Maurier. Armie Hammer, Lily James e Kristin Scott-Thomas estão no elenco e a direção é de Ben Wheatley (“Free Fire”, “Kill List”). Estreia em outubro.
Por fim, saiu o trailer de “Kajillionaire”, novo filme da atriz e diretora Miranda July (“Eu, Você e Todos Nós”). No enredo, um casal de vigaristas (Debra Winger e Richard Jenkins) passa 26 anos treinando sua única filha (Evan Rachel Wood) para enganar e roubar a cada oportunidade, até que uma estranha (Gina Rodriguez) se aproxima da família e a vida da jovem vira do avesso. A comédia recebeu boas críticas no Festival de Sundance. Estreia em setembro, nos EUA. Como é da Focus Features, deve ser um dos primeiros filmes a sentir o efeito do acordo entre Universal e AMC.
In Memoriam: Mais um ícone de Hollywood se despediu. Morreu Olivia de Havilland, aos 104 anos. A atriz ganhou dois Oscars, por "Só Resta uma Lágrima" e "Tarde Demais", e foi indicada outras três vezes, por "E o Vento Levou", "A Porta de Ouro" e "Na Cova da Serpente". Considerada a última estrela viva da Hollywood Clássica, ela iniciou a carreira em 1935, ano em que fez "O Capitão Blood". Também tem entre seus filmes mais conhecidos "As Aventuras de Robin Hood" e "Eu Te Matarei, Querida!" Olivia nasceu em 1º de julho de 1916, em Tóquio, onde seus pais britânicos viviam. Sua irmã, a também atriz Joan Fontaine, outro ícone da Era de Ouro de Hollywood, era um ano mais nova e faleceu em 2013. As duas não tinham um relacionamento fácil e são as únicas irmãs vencedoras do Oscar de Melhor Atriz. Chegaram a concorrer no mesmo ano: em 1942, quando Olivia foi indicada por "A Porta de Ouro", Joan venceu por "Suspeita". Olivia encerrou a carreira nos anos 80. Seu último filme nos cinemas foi "O Quinto Mosqueteiro" (1979) e a última atuação foi no filme para TV "A Mulher que Ele Amou" (1988).
Outro que deixa saudades é o diretor britânico Alan Parker, morto aos 76 anos. São dele filmes como "O Expresso da Meia-Noite" e "Mississippi em Chamas", pelos quais foi indicado ao Oscar. Também fez "Coração Satânico", "Asas da Liberdade", entre outros. Parker também é conhecido pelos filmes musicais que dirigiu: "Pink Floyd - The Wall", "Fama", "Evita" e "The Commitments: Loucos pela Fama". Em sua filmografia estão ainda dramas de guerra como "As Cinzas de Ângela", "Bem-vindos ao Paraíso" e "The Evacuees", seu primeiro filme, feito para TV. No cinema, a estreia foi com "Quando as Metralhadoras Cospem", de 1976. E o último longa foi "A Vida de David Gale", de 2003. De acordo com a família, ele estava doente há bastante tempo. Parker venceu quatro BAFTAs e recebeu o Grande Prêmio do Júri em Cannes por "Asas da Liberdade".
Outras duas mortes que marcaram a semana foram as da atriz Sonia Darrin, que contracenou com Humphrey Bogart no clássico noir “À Beira do Abismo”, e do ator John Saxon, que enfrentou Bruce Lee em “Operação Dragão”.
É isso. Até a próxima edição!
Forte abraço e cuide-se,
Renato Silveira
Editor-chefe do Cinematório